E agora, será que o TSE - Tribunal Superior Eleitoral, também está mentindo? Tirem suas dúvidas!
DECISÃO
Vistos.
Trata-se de agravo interposto por José Laércio Passos Júnior, ex-prefeito no Município de Rosário do Catete/SE, em virtude de decisão do TRE/SE que inadmitiu recurso especial eleitoral - com fundamento no art. 276, I, b, do CE - contra acórdão assim ementado (fls. 426-427):
RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2008. ELEIÇÕES MUNICIPAIS. ABUSO DE PODER POLÍTICO/ECONÔMICO. ART. 22 DA LEI COMPLEMENTAR
N° 64/1990. CONDUTA VEDADA. ART. 73, I e IV, DA LEI
N° 9.504/1997. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97. PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. MORADIA DIGNA. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA FIRMADO ENTRE PREFEITURA E MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. PREVISÃO EM PLANO PLURIANUAL E NA LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTÁRIAS. APRESENTAÇÃO DE PLANILHA DE CUSTOS. ANO ELEITORAL. INCLUSÃO DE ELEITORA, CADASTRADA NA SECRETARIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL, NO CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO DE OBRAS, DURANTE O PERÍODO ELEITORAL. ELEITORA CARENTE E NECESSITADA DE APOIO DO PODER PÚBLICO. AUSÊNCIA DO NOME DA ELEITORAL NO PLANO DE AÇÕES DO ANO ELEITORAL. DELIBERAÇÃO DO GESTOR MUNICIPAL. ADMINISTRADOR APOIANDO À ELEIÇÃO DE SEU SUCESSOR. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO OU DO CONHECIMENTO DOS CANDIDATOS REPRESENTADOS. ABUSO DE PODER DE AUTORIDADE. AUSÊNCIA DE POTENCIALIDADE LESIVA. NÃO CONFIGURAÇÃO DO ILÍCITO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. EXIGÊNCIA DA PARTICIPAÇÃO DO CANDIDATO, AINDA QUE DE FORMA INDIRETA. FINALIDADE DE CAPTAÇÃO ILÍCITA DE VOTO. PROVAS CABAIS, ROBUSTAS E SÓLIDAS INEXISTENTES NOS AUTOS. IMPROCEDÊNCIA. CONDUTA VEDADA. PRESCINDIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DA POTENCIALIDADE LESIVA. RESPONSABILIDADE. INCLUSÃO DE ELEITORA EM PROGRAMA SOCIAL PREVISTO EM LEI, MAS NÃO COMPROVADA A EXECUÇÃO NO ANO ANTERIOR AO DAS ELEIÇÕES. ILÍCITO CONSUMADO. MATERIALIDADE E AUTORIA. COMPROVAÇÃO. PENALIDADE PECUNIÁRIA. ARBITRAMENTO. AUSÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS APTAS PARA MANTER A PENALIDADE NO VALOR ARBITRADO NA SENTENÇA. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO.
1. A procedência de representação, com fundamento no art. 41-A da Lei n° 9.504/97, requer prova robusta da prática de captação ilícita de sufrágio cometida pelo candidato ou a comprovação de sua anuência ao referido ilícito.
2. A caracterização do abuso de poder - econômico ou de autoridade - demanda a efetiva demonstração da potencialidade lesiva dos atos. Doutrina. Precedentes.
3. A prova do ato consubstanciador do abuso de poder deve ser cabal. Precedente. Orientação sufragada por esta Corte Regional: Recurso Eleitoral nº 2945, Acórdão nº 100/2009, Relator (a) GILSON FÉLIX DOS SANTOS, DJ Data 6/4/2009, p. 7.
4. O cerne para a vedação de condutas a agentes públicos em campanhas eleitorais é impedir que a utilização da máquina pública possa desequilibrar o pleito em prol dos detentores de Poder Público. Doutrina.
5. As condutas elencadas nos incisos do artigo 73 da Lei das Eleições são, por presunção legal, tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos nos pleitos eleitorais.
6. A configuração da prática de conduta vedada independe de potencialidade lesiva para influenciar o resultado do pleito, bastando a mera ocorrência dos atos proibidos para atrair as sanções da lei. Precedentes.
7. O exame das condutas vedadas previstas no art. 73 da Lei das Eleições deve ser feito em dois momentos. Primeiro, verifica-se se o fato se enquadra nas hipóteses previstas, que, por definição legal, são "tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais" . Nesse momento, não cabe indagar sobre a potencialidade do fato.
8. Caracterizada a infração às hipóteses do art. 73 da Lei 9.504/97, é necessário verificar, de acordo com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, qual a sanção que deve ser aplicada. Nesse exame, cabe ao Judiciário dosar a multa prevista no § 4º do mencionado art. 73, de acordo com a capacidade econômica do infrator, a gravidade da conduta e a repercussão que o fato atingiu.
9. O cotejamento das circunstâncias fáticas - inclusão de uma única eleitora, cadastrada no Relatório Social da Secretaria Municipal de Assistência Social, no plano de ação do programa de Moradia Digna durante ano eleitoral, programa este previsto em lei, mas não demonstrada a execução desde o ano anterior - não permite a formação de um juízo positivo quanto à potencialidade lesiva para fins de caracterização da prática de abuso de poder político punível com a decretação da inelegibilidade e a cassação do registro dos recorridos (art. 22, XIV, da Lei Complementar nº 64/1990). No entanto, tal situação é suficiente para ensejar a infração eleitoral que consubstancia a prática de conduta vedada (art. 73, § 10, da Lei nº 9.504/1997).
10. Ausência de circunstâncias aptas para manter a pena pecuniária no valor cominado na sentença. Redução da pena para o quantum de 15.000 (quinze mil) UFIR.
11. Improvimento do recurso interposto pela Coligação Representante.
12. Provimento parcial do recurso interposto por JOSÉ LAÉRCIO PASSOS.
Na espécie, o Ministério Público Eleitoral propôs ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) em desfavor do agravante, de Etelvino Barreto Sobrinho e Alexsandro Araújo (eleitos prefeito e vice-prefeito do Município de Rosário do Catete/SE em 2008) e de Cícero José Santos (candidato a vereador no mencionado município) em virtude da suposta prática de abuso do poder político, captação ilícita de sufrágio e conduta vedada aos agentes públicos.
Aduz-se, em síntese, que o agravante e Cícero José Santos,utilizando-se de programa social de reforma e construção de casas populares no referido município, teriam doado materiais de construção a duas eleitoras em troca de votos aos candidatos Etelvino e Alexsandro.
Os pedidos foram julgados improcedentes em primeiro grau de jurisdição em relação a Etelvino Barreto Sobrinho, Alexsandro Araújo e de Cícero José Santos e parcialmente procedentes em relação ao agravante, o qual foi condenado à sanção de multa no valor de 30.000 UFIRs em razão da conduta vedada prevista no art. art. 73, § 10º, da Lei 9.504/97.
O TRE/SE, por sua vez, deu provimento ao recurso eleitoral do agravante para reduzir a multa pecuniária para 15.000 UFIR.
O agravante interpôs recurso especial eleitoral, no qual alega a ocorrência de dissídio jurisprudencial em relação a julgados do TRE/PE, do TRE/GO e do TRE/SP. Aduz que a sanção imposta deve ser reduzida ao mínimo legal, em observância ao princípio da proporcionalidade, haja vista a ausência de má-fé e de malversação de dinheiro público, além do que a conduta impugnada não possui proporcionalidade para influir no resultado da eleição (fls. 447-455).
O recurso especial foi inadmitido sob o fundamento de ausência de similitude fática entre o acórdão recorrido e os julgados supostamente divergentes. Ademais, destacou-se que "a jurisprudência do TSE é pacífica no sentido de que a configuração da prática da conduta vedada independe de sua potencialidade lesiva para influenciar o resultado do pleito, bastando a mera ocorrência dos atos proibidos para atrair as sanções da lei" (fl. 506).
Nas razões do agravo (fls. 509-514), o agravante sustenta essencialmente a possibilidade de conhecimento do recurso especial com esteio no dissídio, visto que:
a) a situação fática presente no julgado oriundo do TRE/PE é semelhante ao caso dos autos e também foi apreciada como suposta conduta vedada prevista no art. 73, § 10, da Lei 9.504/97;
b) o julgado proveniente do TRE/GO, a despeito de tratar de hipótese diversa - divulgação, por meio de trio elétrico, do resultado de pesquisa eleitoral que não foi registrada na Justiça Eleitoral - compreende a aplicação da multa em seu grau mínimo com fundamento na existência de circunstâncias atenuantes;
c) a conduta examinada pelo TRE/SP - que acarretou a fixação de multa no mínimo legal - "possui um espectro de abrangência muito maior que dos autos, possuindo inequívoco potencial de interferência no pleito eleitoral, posto ter sido dirigida a várias pessoas" (fl. 513).
A Procuradoria-Geral Eleitoral opina pelo desprovimento do agravo (fls. 534-537).
Relatados, decido.
O conhecimento do recurso especial com fundamento em suposto dissídio jurisprudencial depende da comprovação, mediante cotejo analítico, da existência de similitude fática entre os julgados confrontados, conforme jurisprudência consolidada desta Corte. Nesse sentido: AgR-AI 719-90/MS,
Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJe de 22/8/2011; AgR-Respe 8723849-29/RO,
Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJe de 26/4/2011; AgR-Respe 1979-90/GO,
Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJe de 1º/8/2011.
Na espécie, a despeito de o agravante ter realizado o cotejo analítico, constata-se a ausência de similitude fática e jurídica entre o acórdão regional e os julgados supostamente divergentes. Transcrevo trecho da decisão agravada que esclarece a questão (fls. 504-505):
Assim, embora a decisão do TRE/PE, prolatada no RE nº 8828, trate também da conduta vedada prevista no art. 73, § 10, da Lei das Eleições, a aplicação da multa no patamar mínimo fundamentou-se numa circunstância específica que foi determinante na dosagem da pena.
Tal circunstância refere-se a programa social oferecido à população carente, que além de possuir autorização em lei, já estava em execução no exercício anterior ao pleito, apresentando apenas como irregularidade ter sido lançado, no ano eleitoral, sob o comando de secretaria diferente daquela que vinha distribuindo o benefício, conforme se extrai do acórdão paradigma
[...]
A decisão do TRE/SP, por sua vez, proferida na Representação nº 22636-79, trata da conduta vedada a agente público prevista no art. 73, I, da Lei 9.504/97, praticada por meio de utilização de e-mail institucional e equipamento de informática da Câmara Municipal para divulgar propaganda eleitoral em benefício de candidato a deputado estadual.
Por fim, o julgado de Goiás, Recurso Eleitoral nº 6128, versa sobre divulgação de suposta pesquisa de intenção de voto por várias ruas e avenidas da cidade de Caldas Novas sem o devido registro na Justiça Eleitoral, por meio de trio elétrico a serviço de candidato ao cargo de prefeito, em afronta ao artigo 33 da Lei nº 9.504/97.
Já o caso dos autos cuida de conduta vedada prevista no art. 73, § 10, da Lei nº 9.504/97, com a diferença de que o programa social de Moradia Digna foi previsto em lei, mas sua execução no ano anterior ao das eleições não fora comprovada, fato que levou à cominação da multa ao recorrente no valor de 15.000 UFIR, considerada pelo relator como suficiente à reprovação da conduta e proporcional à infração perpetrada, consoante se extrai do julgado regional [...].
Desse modo, o agravo não merece prosperar, haja vista que o recurso especial ao qual pretende dar seguimento é manifestamente improcedente.
Forte nessas razões, nego seguimento ao agravo, nos termos do art. 36, § 6º, do RI-TSE.
P. I.
Brasília (DF), 15 de agosto de 2012.
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora